Por Época - Postado por Abraao Na Rede
R$ 363 milhões. Este é o valor do contrato que a Adidas propõe ao Flamengo para se tornar fornecedora de materiais esportivos
dele por dez anos, de 1º de maio de 2013 até 30 de abril de 2023. Um
acordo que, em suas muitas cláusulas, revela um choque cultural entre
uma empresa alemã e um time de futebol brasileiro. A rígida disciplina
diante de uma certa desordem.
Antes de tudo, vamos aos
números de um contrato de dezenas de páginas, ao qual o blog teve
acesso. Os alemães se propõem, de imediato, a pagar uma “taxa de início
de parceria” de R$ 38 milhões, dos quais R$ 13 milhões devem ser pagos
em até um mês após a assinatura do contrato e R$ 25 milhões em até um
mês a partir de 15 de janeiro de 2013.
De patrocínio, a Adidas
ofereceu R$ 12,5 milhões anuais nos primeiros cinco anos de contrato e
R$ 17,5 milhões nos últimos cinco, em parcelas iguais que são pagas nos
dias 1º de abril e 1º de outubro.
Em fornecimento de materiais esportivos, são R$ 8 milhões anuais em uniformes, com um limite de cerca de 110 mil peças.
Dos
produtos que a Adidas vender, a fabricante promete uma garantia anual
de R$ 8 milhões. Ou seja, se poucas camisas forem vendidas, o clube irá
ganhar de qualquer modo R$ 8 milhões por ano. Se este valor for
extrapolado, há royalties de 10% para produtos com marca Adidas e 4%
para aqueles que são vendidos sem nenhuma marca, chamados de unbranded
no mercado.
Por fim, em verba de marketing, a ser utilizada para contratar um gerente global de marketing esportivo e realizar ações com o intuito de promover os produtos do Flamengo, no Brasil e no exterior, há R$ 1,5 milhão anual.
Faça
as contas. R$ 150 milhões em patrocínio, R$ 80 milhões em materiais
esportivos, R$ 80 milhões em garantia mínima por venda de licenciados,
R$ 15 milhões por verba de marketing e R$ 38 milhões de imediato. Um
contrato de R$ 363 milhões, no mínimo um dos dois mais valiosos do país,
ao lado do que a Nike acabou de assinar com o Corinthians, que está no
mesmo patamar.
Numeros à parte, há diversas cláusulas que
contrapõem as práticas que a Adidas aplica na Europa, onde o futebol é
muito mais profissional do que no Brasil, com episódios recentes da
história do Flamengo.
A fabricante alemã exige, por exemplo, que
haja sete meses de antecedência do início de uma nova temporada para
preparar os novos uniformes, um tempo para organizar os pedidos e as
entregas dos materiais às lojas. O Flamengo, que com a Olympikus não
precisa de mais do que um ou dois meses, quer menos.
Em outro
ponto, os alemães querem que as marcas dos patrocinadores do time sejam
apresentadas com um ano de antecedência para a inserção na camisa. O
clube disse que este prazo está “fora de sua realidade” e quer que seja
de no máximo três meses.
A fornecedora também faz uma exigência
que destoa, e muito, do atual futebol brasileiro. Quer que haja apenas
três marcas de patrocinadores na camisa. O Flamengo diz que precisa de
seis espaços: dois para logotipos do patrocinador máster (peito e
costas), dois nas mangas e dois na barra da camisa e no calção.
Um
outro exemplo de choque cultural diz respeito à exposição da marca da
fornecedora em entrevistas. Quantas vezes você já viu um jogador de
futebol, após uma partida,
tirar a camisa e falar à imprensa sem se preocupar em ficar diante
daquele painel com marcas de patrocinadores? A Adidas exige que essas
cenas sejam proibidas. Obriga o clube a expor seu logotipo para a mídia.
A
Adidas também diz que o Flamengo deve obrigar seus atletas a comparecer
em pelo menos quatro “atividades promocionais” por ano em qualquer
lugar do Brasil. Uma exigência que o clube pouco se preocupou até hoje.
Quer um exemplo?
Em novembro de 2011, a Procter & Gamble, à
época a principal patrocinadora, pediu que jogadores do clube usassem
uma marca da Duracell que acendia na parte de trás do uniforme. Uma ação
muito legal. Criativa e simples. Mas que Ronaldinho Gaúcho, principal
estrela da equipe na ocasião, se recusou a participar. E não participou.
O time inteiro usou a pilha acesa, menos ele.
O time
principal também deve estar disponível para um amistoso por ano, “com o
time mais forte possível”, em uma partida cujos direitos comerciais
pertencem à Adidas. A fornecedora organiza, tem direito a toda a receita
com a venda de ingressos e patrocínios, menos os direitos de transmissão, que seriam recebidos pelo clube.
Outra
cláusula: o Flamengo deve zelar pela marca Adidas e coibir que seus
jogadores a “ridicularizem, critiquem, ataquem ou denigram”.
Novamente,
não é preciso viajar a uma passado muito distante para lembrar dos
episódios que Adriano, protagonista do time carioca no título nacional
de 2009, se envolveu. Brigas, bares, boatos, um monte de notícias que
foram publicadas pelas páginas policiais e de celebridades que a Adidas
abomina.
Todas essas cláusulas indicam que a cultura brasileira
terá de se adaptar a uma nova realidade, a de empresas extremamente
profissionais, que preveem todo e qualquer incidente em contrato e
ameaçam rompê-lo caso qualquer uma das cláusulas seja descumprida.
E
o Flamengo negocia para abrandar muitas das exigências. Diz, por
exemplo, que o que seus jogadores fazem em horário de lazer não lhes diz
respeito.
Mas é o preço a se pagar caso queira a tão sonhada internacionalização.
Caso
assine, o Flamengo passa a estar no portfólio obrigatório da Adidas de
produtos, para que suas camisas estejam disponíveis em todo o mundo. Em
contrato, a fabricante se compromete a colocar os uniformes rubro-negros
em 1,5 mil lojas próprias, sendo 600 nos dez principais mercados
mundiais.
Vale se submeter a regras rígidas para levar o Flamengo ao mundo?
Eduardo Bandeira de Mello, novo presidente, terá de decidir.
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